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As empresas jornalísticas estão a contratar cada vez mais estagiários em detrimento de jornalistas experimentados porque não têm "capacidade reivindicativa" e as entidades patronais beneficiam "desta passividade, destes baixos custos, para fazer sobreviver as redações sem contestação e a preços inferiores". Esta uma das conclusões que um investigador extrai de uma análise ao sector da comunicação social portuguesa.
"O número de jornalistas com carteira profissional está a diminuir desde 2000, enquanto o de estagiários aumenta. “O estagiário está a exercer as funções que são próprias a um jornalista profissional”, alerta o coordenador de um estudo.
Em entrevista à agência Lusa, o professor universitário José Rebelo, que coordenou a equipa do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) responsável pelo estudo “Ser jornalista em Portugal – perfis sociológicos”, que na quinta-feira será lançado em livro, realça que “o número de estagiários [no jornalismo] tem vindo a aumentar significativamente”.
No exercício de funções “próprias a um jornalista profissional”, o estagiário “exerce-as, por um lado, ganhando menos ou não ganhando, e por outro lado, sem qualquer, ou com uma reduzidíssima, capacidade reivindicativa”, sublinha o docente e também ex-jornalista.
Os estagiários “receiam, estão numa situação precária e procuram sobretudo criar um posto de trabalho que não têm”, destaca, considerando que as entidades patronais “beneficiam desta passividade, destes baixos custos, para fazer sobreviver as redações, sem contestação e a preços inferiores”.
Por outro lado, a diminuição do número de jornalistas profissionais justifica-se com “a crise” – que levou ao encerramento e fusão de órgãos de comunicação –, mas também com o “desenvolvimento dos grupos multimédia”. Estes contribuem “para reduzir os postos de trabalho, na medida em que o mesmo jornalista escreve um artigo para o jornal, um texto para a televisão e é capaz mesmo de escrever uma peça para a rádio”, assinala.
Todas estas alterações resultaram em “relações de tensão” nas redações, que hoje dispõem de gente “mais qualificada, sem dúvida”, mas sujeita também a “um aumento claro dos níveis de precariedade”. Essa “tensão” também existe entre as gerações de jornalistas, porque “os mais velhos” veem no jornalismo “uma missão”, enquanto “os mais novos” o encaram como “uma profissão”.
Recordando que alguns dos entrevistados para o estudo “já vão para aí no terceiro estágio”, José Rebelo frisa que “a inovação e a irreverência não vêm dos mais jovens, vêm daqueles já instalados na profissão, o que parece um paradoxo, só que para se ser irreverente é preciso ter condições para isso e a precariedade não encoraja a irreverência”.
Acreditando que "[hoje] haja autocensura, relativamente ao poder político, ao poder económico”, José Rebelo conta que os jornalistas reconhecem sempre “pressões” sobre os outros, mas nunca sobre si mesmos. “Quando se pergunta a um jornalista ou um estagiário ‘acha que há pressões que se exercem junto dos jornalistas’, respondem todos que sim; quando se pergunta ‘e sobre si foram exercidas pressões’, respondem que não”.
A criação de uma Ordem profissional de jornalistas é uma das perguntas-guião das entrevistas: a maioria “muito clara” é contra (opinião partilhada por José Rebelo), mas todos concordam com a “necessidade de reforçar o Código Deontológico”.
Há a ideia de que a Ordem implica “uma imposição de regras, que podem ser expressão de uma arbitrariedade, de uma relação de poder que fuja ao controlo dos próprios jornalistas”, reflete.
Editado pela Gradiva, o livro “Ser jornalista em Portugal – perfis sociológicos” é lançado na quinta-feira, no ISCTE (Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa), em Lisboa".
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